Almanaqueiras: ou não queiras.

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segunda-feira, 10 de abril de 2017

só os dados tiram o demônio das pessoas.

Na periferia de São Paulo ninguém sonha em morar na Venezuela 

Celso Rocha de Barros


Sao Paulo,, Brasil, 03-09-2015 14h51:***Para DOMINGO FOLHA*** Prefeito Haddad ignora obras na periferia de SP. Acumulo de lixo e esgoto no corrego Itaim, no bairro Itaim Paulista(Foto Eduardo Knapp/Folhapress. COTIDIANO). Cod do Fotografo: 0716


Vale parafrasear a velha pichação evangélica: só os dados tiram o demônio das pessoas. A Fundação Perseu Abramo, "think-tank" ligado ao Partido dos Trabalhadores, publicou uma pesquisa sobre "Percepções da Periferia" em que entrevistou 63 pessoas em São Paulo, selecionadas por terem votado no PT durante o ciclo lulista e abandonado o partido nas eleições do ano passado.

Os resultados da pesquisa, amplamente divulgados na imprensa, mostraram um morador de periferia que valoriza o empreendedorismo e a iniciativa pessoal, que apoia programas sociais, mas espera, sobretudo, que políticas públicas lhes abram possibilidades que eles mesmo explorem como acharem melhor.

É especialmente interessante que os pesquisadores tenham encontrado, entre os programas sociais petistas elogiados pelos entrevistados, destaque para o Prouni e o Fies, que possibilitam o acesso de jovens pobres à universidade. Sim, as universidades que os pobres frequentam raramente lhes darão a chance de competir com quem estudou na USP. Mas só menospreza uma chance de vitória de 10% quem nunca teve chance zero.

Os resultados também confirmam a intuição de André Singer em sua análise do lulismo: os mais pobres são aversos a radicalismos porque a desordem é especialmente perigosa para quem está a poucos passos do desastre. Propostas ousadas (mesmo as boas) implicam risco de perdas, e os pobres têm pouca margem para perder sem perder tudo.

Enfim, a pesquisa da Perseu Abramo é, sim, uma surra de pá em quem defende uma virada radical à esquerda no PT. Ninguém na periferia de São Paulo quer morar na Venezuela. Se for por conservadorismo que os pobres não bebem o suficiente para apoiar o governo Maduro, palmas para o conservadorismo. Talvez a direção do PT devesse começar a frequentar cultos evangélicos.

Mas também seria errado interpretar os resultados da pesquisa da FPA como um endosso à desregulamentação liberal. Quem assiste programas evangélicos já viu gente agradecendo a bênção de um processo ganho na Justiça. Estou disposto a apostar que foi trabalhista.

Com esses mesmos valores, os entrevistados pela FPA votaram no PT durante todos esses anos. O que fica claro é que votaram porque os programas do PT lhes ajudaram a se inserir na economia de mercado com mais poder de barganha, com mais possibilidades de sucesso, com uma rede de segurança que lhes facilita a administração de riscos. E, sobretudo, porque lhes permitiu sonhar que seus filhos tenham ao menos alguma chance de brigar por prêmios maiores.

O Partido dos Trabalhadores, que, por incrível que pareça à luz de seus documentos recentes, era governo quando esses programas bons foram implementados, precisa beber um café forte, tomar um banho frio e retomar essa agenda.

E os adversários do PT precisam esclarecer, finalmente, o que têm para oferecer que aumente o poder de barganha, as possibilidades de sucesso e a rede de segurança dos brasileiros de baixa renda. A terceirização sem limite recém-aprovada, por exemplo, vai exatamente na direção oposta. Vamos esperar que as reformas em curso não destruam a reputação do mercado junto aos pobres, construída depois de tantos anos do que Amartya Sen chamaria de redistribuição de liberdades.

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